sábado, 8 de junho de 2013

Faltas não apuradas não podem impedir indulto a preso

O cometimento de falta grave nos últimos 12 meses de cumprimento da pena, contados retroativamente à publicação do indulto de Natal, não inviabiliza o deferimento da comutação. Afinal, a teor do artigo 4º do Decreto 7.648/2011, é necessário que a falta disciplinar tenha sido, também, homologada pelo juízo antes da publicação da benesse.
Com esse entendimento, a maioria dos integrantes do Terceiro Grupo Criminal, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve a concessão de indulto de Natal a um preso que fugiu seis vezes do regime aberto, entre 2010 e 2011. O Grupo, que reúne a 5ª e a 6ª Câmaras Criminais da corte, uniformiza sua jurisprudência em sessões que ocorrem em uma sexta-feira por mês.
A benesse havia sido suspensa por decisão da 6ª Câmara Criminal que, atendendo a pedido do Ministério Público, entendeu que o juízo da Vara de Execuções Criminais de Novo Hamburgo não poderia deferi-la, em face das constantes fugas do apenado. Como o julgamento não foi unânime no colegiado, o autor pediu a prevalência do voto perdedor, do desembargador Ícaro Carvalho de Bem Osório, que votou pela manutenção do benefício.
Ausência de PADO relator dos Embargos Infringentes, desembargador Aymoré Roque Pottes de Mello, fez prevalecer o voto minoritário, reformando o acórdão da 6ª Câmara Criminal. Ele anotou que as alegadas condutas que caracterizam faltam grave não foram apuradas, nem reconhecidas pelo juízo das Execuções Criminais. E que não há notícias de que tais condutas tenham sido apuradas em Procedimento Administrativo-Disciplinar (PAD) ou reconhecidas pela autoridade judiciária.
Restaram vencidos os desembargadores Ivan Leomar Bruxel e Bernadete Coutinho Friedrich. A sessão de julgamento ocorreu no dia 5 de abril.
O casoCondenado a três anos de reclusão em dois processos criminais — porte de arma e furto simples —, o autor estava cumprindo pena privativa de liberdade em regime aberto desde 11 de novembro de 2010, quando deu início a uma sequência de seis fugas. A primeira aconteceu em 26 de novembro de 2010, a última, em 4 de junho de junho de 2011.
Em 22 de maio de 2012, o apenado requereu o indulto de Natal, benesse sancionada pela presidente Dilma Roussef em dezembro do ano anterior, por meio do Decreto 7.648. O juízo da Vara de Execução Criminal Regional da Comarca de Novo Hamburgo, na Região Metropolitana de Porto Alegre, deferiu o pedido com base no artigo 1º, inciso I, do Decreto, mesmo com as faltas pendentes. O dispositivo indulta condenados que tenham cumprido um terço da pena.
Por meio de Agravo em Execução, o Ministério Público estadual se insurgiu contra a concessão do indulto, alegando que a série de fugas impossibilita seu deferimento. É que, ao fugir, o apenado incorreu em falta grave, conforme o artigo 50, inciso II, da Lei de Execução Penal (LEP). Para negativa de concessão do indulto — sustentou o MP —, independe se a falta grave foi homologada nos 12 meses anteriores à publicação do Decreto ou no ano seguinte.
O representante da Defensoria Pública estadual também apresentou suas razões. Em síntese, disse que o autor fazia jus ao benefício porque não existe registro de falta grave homologada nos últimos 12 meses anteriores à data de concessão. A decisão do juízo seria, então, correta.
Falta de consensoO relator do Agravo em Execução na 6ª Câmara Criminal, desembargador José Antônio Daltoé Cezar, se alinhou à tese do MP, dando provimento ao recurso para desconstituir a concessão do indulto.
O magistrado entendeu que o fato das faltas graves não terem sido homologadas nos 12 meses anteriores não constitui óbice ao indeferimento do benefício, sob pena de o apenado vir a se beneficiar da sua própria torpeza. É que quanto mais tempo permanecer foragido, menos tempo terá o juízo para apurar e homologar a falta considerada grave.
‘‘Dessa forma, caso empreenda fuga e seja recapturado a tempo de ter a falta grave homologada no período dos 12 meses anteriores à publicação do Decreto, não terá o indulto concedido. Se permanecer foragido até a publicação do referido Decreto, porém, não terá sua falta grave homologada e, por consequência, terá direito à concessão do benefício’’, explicou no acórdão. A desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich votou com o relator, definindo o julgamento — realizado no dia 11 de outubro de 2012 — por maioria.
A divergência ficou por conta da posição do desembargador Ícaro Carvalho de Bem Osório. Primeiramente, observou, os autos deixam claros que, na época de promulgação do decreto que criou o indulto, as alegadas transgressões disciplinares não haviam sido objeto de apuração, tampouco de homologação.
Além disso, conforme dispõe artigo 4º, caput e parágrafo 1º, do Decreto 7.468/2011, a concessão do benefício fica condicionada à inexistência de aplicação de sanção, homologada pelo juízo competente, garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa, por falta disciplinar de natureza grave, prevista na Lei de Execução Penal, cometida nos 12 meses de cumprimento da pena, contados retroativamente à publicação do Decreto.
A literalidade do parágrafo 1º, encerrou, é ainda mais esclarecedora: ‘‘A prática de falta grave após a publicação desse Decreto ou sem a devida apuração nos termos do caput não impede a obtenção dos benefícios previstos neste Decreto’’.
Clique aqui para o acórdão do Terceiro Grupo Criminal.
Clique aqui para ler o acórdão da 6ª Câmara Criminal.
Clique aqui para ler o Decreto 7.648/2011.

Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 8 de junho de 2013

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