quarta-feira, 4 de outubro de 2017

COTIDIANO CRIMINAL, POR PATRÍCIA PESTANA DE AZEVEDO: O QUE É SEXTORSÃO?

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Olá pessoal do Grupo,
Vamos para mais uma quarta-feira tratando de um fato do cotidiano criminal. Então, li na Veja desta semana (Edição 2550 – ano 50 – n.º 40) uma matéria falando sobre o perigo do: “manda nudes pra mim”.
Lembro muito bem quando o escândalo do relacionamento extraconjugal envolvendo o, na época (1998), presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton e a sua jovem estagiária Mônica Lewinsky tomou proporções desastrosas. Cerca de dias, trechos sórdidos das gravações telegráficas da estagiária com uma colega de trabalho estouravam nas caixas de e-mail de milhares de pessoas em todo o mundo.
E olha que não se tratava de “nudes” e a velocidade das transmissões de informações não eram instantâneas como são o whatsapp, snapchat, telegrama ou outro mecanismo de conversação da atualidade. Sei que o presidente foi absolvido pelas acusações de perjúrio e obstrução de justiça, mas e Mônica?!? Cumpre “pena perpétua” por ter perdido o direito de errar e de o ver esquecido. Sim, um erro! Quem nunca cometeu erros aos 21 anos de idade que atire a primeira pedra, virtual de preferência.
Lamentavelmente, esse tipo de acontecimento resulta em suicídio, na pior das hipóteses, ou ainda, em mudança de domicílio, de país, de profissão, e perfeito quando os três calham ao mesmo tempo. Enfim o fantasma que assombra essa vítima não é mais virtual, é bem real. A reconstrução de uma imagem fortemente abalada é uma tarefa árdua, e, em virtude das raras exceções, não é impossível.
Outro fato marcante, dessa vez no Brasil, ocorreu com a atriz Carolina Dieckman após o vazamento de fotos íntimas da atriz na internet em 2012 ao negar o pedido de extorsão em troca da não veiculação.  
A aprovação da Lei n.º 12.737/2012 (pioneira no que tange a crimes cibernéticos), apelidada de Lei Carolina Dieckman, introduziu, dentre outras inovações, o artigo 154-A, prevendo o crime de invasão de dispositivo informático ao Código Penal, qual seja:
“Art. 154-A. Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.”
Passo agora, delinear alguns conceitos importantes que facilitam a identificação de um procedimento inédito no Brasil: o SEXTORSÃO (Sexting sob ameaça, Violência Virtual ou Sextortion).
A situação fática é a seguinte: uma moça envia uma foto sua nua ao seu parceiro de Facebook (relacionamento estritamente virtual). Este, passa a exigir mais fotos dela pelada em diversas posições e lugares, depois exige vídeos da moça se masturbando, sob ameaça de ter sua intimidade exposta de na rede em fração de segundos. Não satisfeito o parceiro pressiona-a a fazer sexo real utilizando-se das mesmas chantagens e ameaças, alguns pedem dinheiro também. Neste momento, passados 2 anos, vivendo esse terror a moça procura a polícia em busca de proteção. Vamos aos conceitos:
O que é SEXTING?
Consiste no ato de enviar fotos ou filmes sensuais, textos eróticos, áudios pervertidos através de mensagens instantâneas, chats, e-mails ou afins. Não merece responsabilidade civil nem penal quando há consentimento mútuo e tudo ocorre conforme o combinado.
Porém, se a vítima for menor de 14 anos de idade o agente pode responder por:
  • CORRUPÇÃO DE MENORES (art. 218, do CP) quando o agente induz a vítima (menos de 14 anos) a praticar algum ato que vise satisfazer a lascívia de outra pessoa. Inexiste contato físico entre os envolvidos portanto, perfeitamente possível no mundo cibernético.
E como diferenciá-lo da CORRUPÇÃO DE MENORES DO ECA (art. 244-B)? Neste, o agente pratica crime ou infração penal acompanhado de menor de 18 anos, ou o induz a praticá-lo. Não há exigência de um resultado naturalístico para a sua consumação (como a satisfação de lascívia do art. 218 do CP), ou seja, a prática de qualquer crime ou contravenção o caracteriza.
  • SATISFAÇÃO DE LASCÍVIA MEDIANTE PRESENÇA DE CRIANÇA E ADOLESCENTE (art. 218-A) quando a vítima, menor de 14 anos, estiver diante de ato sexual com a finalidade de satisfazer a lascívia própria ou de determinada pessoa. Ex: numa sala de cinema.
  • Numa Quarta hipótese, o crime previsto no art. 241-D, II, do ECA é admissível quando o menor de 14 anos for aliciado, assediado, instigado ou constrangido a com o agente praticar ato libidinoso, por qualquer meio de comunicação (ex.: videoconferência).
  • FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE VULNERÁVEL (art. 218-B), ocorre quando a vítima é menor de 18 anos ou quem, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato sexual. Configura, também, o tipo penal nos casos praticados contra menor de 14 anos quando o aliciamento se dá a um número indeterminado de pessoas. Ex: prostituição, turismo sexual.
O que se entende por CYBER BULLYING?
É a intimidação ou violência psicológica, intencional e repetida contra pessoa específica no mundo virtual.
O bem jurídico aqui tutelado é a honra, intimidade, imagem ou privacidade do indivíduo, cabendo indenização por danos morais a serem pagas pelos responsáveis dos bullies (agressores ou praticantes de bullying). Passível de adequação típica em qualquer dos crimes contra a honra, previstos nos arts. 138 a 145 do Código Penal. Se a prática é acompanhada de ameaça, aceita-se o enquadramento do art. 147 do CP. Com exceção dos arts. 140, §§2º e 3º e 141, incisos I e II do CP, a ação penal é tipicamente privada (se procede mediante queixa-crime). Nestes casos, tem-se um maior número de casos, tanto como vítimas quanto agressores, figurados por meninos na faixa entre 12 e 14 anos.
E SEXTORTION?
Sem previsão penal no Brasil a “extorsão sexual”, “sextorsão” ou “sexting sob ameaça” como também vem sendo chamada, ocorre quando o agente obriga a vítima a produzir e enviar, habitualmente, sextings com a finalidade de satisfazer lascívia, sob chantagem ou ameaça de expô-las na internet.   
O recentíssimo Projeto de Lei n.º 8.540/2017, pelo Deputado Assis Melo, apresentado em 12.09.2017, prevê o acréscimo do art. 154-C ao Código Penal, com a seguinte redação:
“Art. 154-C. Incorre nas mesmas penas previstas neste Decreto-Lei, quem por meio da Internet, dispositivos eletrônicos e ambiente virtual, desenvolver, difundir, induzir, injuriar ou incitar a intolerância, ódio, preconceito, exclusão e violência, de qualquer forma, inclusive simbólica, por motivo de raça, cor, gênero e identidade de gênero, orientação sexual, religião, origem nacional ou étnica, idade ou condição de pessoa com deficiência. Pena: reclusão, de um a três anos, e multa. § 1º. A pena aumenta-se de um terço se sob denominação própria ou não, associarem-se três ou mais pessoas com o fim de cometer algum dos crimes previstos neste Decreto-Lei. § 2º. A pena aumenta-se em metade se a intolerância, ódio, exclusão e violência for praticada: I - com uso de ameaça; II - abuso de autoridade; III - contra menor de dezoito anos;”
Em busca de solução penal, delegados têm seguido o polêmico entendimento de indiciar esses cafajestes da mais baixa estirpe pela prática de estupro pelo constrangido de obrigar a vítima à praticar ato libidinoso, mediante violência ou grave ameaça (art. 213 do CP). Os temerários preferem seguir o entendimento pela prática nos crimes de ameaça (art. 147 do CP), difamação ou/e injúria (arts. 139 e 140 do CP).
De qualquer forma, evitar “galãs apaixonados” que, favorecidos pela vulnerabilidade virtual (falso anonimato), “exigem” nudes com o famoso “nunca te pedi nada” ou “eu mando o meu e depois você manda o seu” - verdadeiros aproveitadores da fragilidade de mulheres inexperientes (sim, estamos falando de crime de gênero) – diminuem, consideravelmente, as chances de ter sua intimidade brutalmente invadida, pois assim como a alegria de um bom coração é revigorada a cada manhã a mente sebosa de um coração amargo é renovada a cada anoitecer.


Patrícia Pestana de Azevedo
Advogada Criminalista



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