O grupo visa investigar os sistemas jurídico-penais contemporâneos a partir da análise crítica do direito penal e processual penal, verificando em seus fundamentos as diferentes formas de violação/proteção dos direitos da pessoa humana.
segunda-feira, 23 de julho de 2012
Despreparo policial: abordagem e morte
Um dos aspectos principais de combate à criminalidade, por óbvio, é contar com um sistema policial de segurança eficaz. Quando se trata de criminalidade violenta, isto significa que policiais devem ter o preparo adequado para situações de confronto, para dizer claramente, devem ter a postura e a conduta mais acertada para enfrentar conflitos em que o agressor esteja armado. Em síntese, eles têm de ser treinados.
Portar uma arma de fogo não é uma prerrogativa da função policial, é uma obrigação que exige consciência de tal responsabilidade. A função de uma arma é reduzir a capacidade de ataque de um confrontante, ferindo-o ou matando-o. Não há meio termo. Para o policial, o confrontante só pode ser um agressor que, em dada situação caracterizadora da prática de crime, aja com violência em face da perspectiva de ser detido ou impedido. A ação do criminoso-agressor, para se caracterizar como tal, deve ser violenta no sentido de ser real ou efetivamente passível de se concretizar como real, colocando em risco a vida do policial envolvido ou de cidadão presente ao evento. O criminoso-agressor precisa ser identificado com clareza no decurso da ação, sendo inadmissível qualquer dúvida sobre sua posição de confrontante.
Assim, o uso da arma pelo policial tem sempre de ser resultado da ação do agressor, vale dizer, é sempre uma reação a um ataque efetivo ou possivelmente imediato. Caracterizada tal situação, o policial tem a obrigação de agir com a energia necessária para interromper de modo rápido a agressão, reduzindo o risco contra si ou contra terceiro envolvido. Não existe a chamada violência policial quando o agente da lei, em confronto de risco caracterizado como acima descrito, venha a tirar a vida do agressor.
Somente a formação mediante treinamento constante permite ao policial a acuidade para agir bem quando colocado em confronto. A prática diária é uma exigência da função, aliada a estudos teóricos referentes a matérias correlatas, tais como noções sobre armamento e tiro, técnicas de abordagem e perseguição, técnicas de defesa, enfim, o conjunto dos conhecimentos necessários para que o policial possa trabalhar nas ruas, nas mesmas ruas em que cidadãos passam para ir a seu trabalho, para se distrair, para cumprir seu papel de cidadania.
O policial jamais pode esquecer que em sua não fácil tarefa ele lida diuturnamente com cidadãos, com pessoas de bem, com indivíduos que se esforçam por uma vida melhor, inconscientes muitas vezes dos problemas sociais que invisíveis os cercam. O policial assim tem de saber ser cortês, tem de agir com civilidade, não pode jamais ser truculento. Tem de saber equilibrar a força e a brandura.
Infelizmente, recentes acontecimentos noticiados pela mídia, reportando até mesmo a morte de pessoas verdadeiramente inocentes, posto que vítimas na situação, como o caso do empresário Ricardo Prudente de Aquino, ocorrida no última dia 19 de julho, na Vila Madalena em São Paulo, demonstraram que estamos muito longe de nos encontrarmos nas ruas com tais policiais.
Casos como este evidenciam a verdadeira violência policial. Agentes da lei que numa situação de confronto efetivo não tiveram o discernimento necessário para reagir e acabaram por tirar a vida de um cidadão de bem, daquela pessoa que justamente juraram proteger.
Não há justificativa. A perseguição foi inadequada, pois não acionaram os necessários reforços, a abordagem foi execrável porque não identificaram o agressor e, por fim, tendo tomado controle da situação, não tiveram o cuidado de verificar quem era a pessoa que tinham sido abordada.
Mais vergonhosa ainda é a desculpa apresentada pelo Comandante Geral da PM, que justificou a execrável ação com o argumento de que tecnicamente a ação foi correta. Não foi.
Uma vida foi perdida por ação impensada e inadequada que, por não seguir procedimentos corretos, nem sequer pode ser qualificada de trabalho policial. A única esperança é que a morte deste jovem sirva como marco de mudanças para a concretização de uma instituição policial na qual seus agentes tenham a consciência da importante função que realizam.
Fonte: João Ibaixe Jr. é advogado criminalista, escritor e jornalista. Possui pós-graduação em Filosofia e mestrado em Direito. Foi delegado de Polícia e assessor jurídico da Febem, atual Fundação Casa, e coordenador de núcleo de pesquisa no Departamento de Pós-graduação em Direito da PUC-SP. Organizador do “Plano de Legislação Criminal” de Jean-PaulMarat e autor do livro “Diálogos Forenses”, é palestrante do Departamentode Cultura da OAB-SP e editor dos blogs Por Dentro da Lei e Criminalista Prático. É também membro efetivo do Núcleo de Aprimoramento Jurídico e Integração Cultural da OAB-SP e presidente do Instituto Ibaixe, criado para desenvolver estudos e eventos jurídicos, filosóficos e culturais.
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