sábado, 5 de janeiro de 2013

Princípio da insignificância na jurisprudência brasileira: um “neoinstituto” penal


O Princípio da Insignificância tem sido cada vez mais aplicado e debatido pela jurisprudência brasileira, mas  infelizmente ainda se verificam muitas impropriedades e até erros na sua aplicação.
O Princípio da Insignificância é extraído da idéia funcionalista teleológica do Direito Penal, que tem como principal autor o alemão Claus Roxin, que pensa todo o Direito Penal em virtude das funções da pena que para ele não podem ser outras que não preventivas. Assim, para o referido autor, o Direito Penal, que tem por objeto primordial a proteção subsidiária de bens jurídicos, somente se justifica  `a luz da proteção dos bens jurídicos e dos fins preventivos da pena.
Daí, decorre o Princípio da Intervenção Mínima do Direito Penal, que tem como “subprincipios” a fragmentariedade e a subsidiariedade do Direito Penal, que não deve se importar com lesões insignificantes aos bens jurídicos, mas somente com condutas que causem efetiva lesão ou perigo de lesão aos bens jurídicos tutelados, nos termos do chamado Princípio da Ofensividade ou Lesividade.
Esses princípios políticos criminais vão, na visão de Roxin, orientar toda construção e aplicação da Dogmática Penal. Assim, o conceito analítico de crime que desde Welzel está configurado como Conduta (ação ou omissão), Típica, Ilícita e Culpável, deve ser analisado á luz dos princípios político-criminais.
Na análise do primeiro elemento – Tipicidade – o princípio da Ofensividade e da Intervençao Mínima permite uma diferenciação entre a chamada tipicidade formal e a tipicidade material. A primeira seria a mera descrição da conduta proibida abstratamente na norma, ou seja, a previsão do tipo penal. A tipicidade formal, então, é a mera adequação entre a conduta praticada em concreto e sua previsão na lei penal. Porém, segundo os princípios acima mencionados, essa tipicidade formal, por si só, não seria suficiente para configurar o primeiro elemento do conceito de crime – Tipicidade -, pois para tanto também seria necessário a configuração da tipicidade material, que somente se configuraria com a efetiva lesão ou perigo de lesão do bem jurídico tutelado no tipo penal. Somadas as duas – tipicidade formal e material – configura-se o primeiro elemento do crime: a TIPICIDADE.
No caso do furto, portanto, a tipicidade formal está caracterizada com a simples subtração de uma coisa alheia móvel para si ou para outrem, independentemente do que seja essa coisa e qual seja o seu valor. Porém, a tipicidade material somente se configura quando a subtração é de uma coisa alheia móvel que efetivamente configure uma lesão ao bem jurídico tutelado, qual seja, o patrimônio. Isso se dá, pois lesões insignificantes ao patrimônio não podem ser objeto do Direito Penal, pois o Princípio da Ofensividade e da Intervençao Mínima não permitem que o Direito Penal se atenha a lesões insignificantes, mas somente com lesões importantes ao bem jurídico, pois do contrário o Direito Penal deixa de ser a ultima ratio e passa a ser a prima ratio, o que é completamente incompatível com o Estado Democrático de Direito e com o Direito Penal Moderno.
Logo, portanto, a lesão ínfima, insignificante, não é materialmente típica, pois o tipo penal de furto não foi feito para proteger o patrimônio dessas lesões, mas sim de lesões efetivas.
A isso, e somente a isso, refere-se o Princípio da Insignificância, ou seja, à TIPICIDADE, que é um elemento completamente OBJETIVO do tipo penal. Por isso, toda e qualquer outra forma de valoração ou análise não pode ser feita nesse elemento do crime. Não importa, portanto, se o autor abusou da confiança, se é reincidente, se é bom, se é mau, se é bonito, se é feio, pois analisa-se, nesse momento, somente a tipicidade, que deve ser objetiva.
Age, portanto, erroneamente o julgador quando afasta a aplicação do Princípio da Insignificância em virtude da personalidade do réu, do seu meio de agir, de seus antecedentes criminais etc., pois tudo isso não se relaciona ao fato praticado, mas sim à culpabilidade do agente, que somente poderá ser analisada no último elemento do crime.
Portanto, a decisão ora em tela do STJ encontra-se completamente afastada da técnica dogmática, pois faz uma confusão entre o fato praticado e a personalidade do agente, deixando de afastar a tipicidade pela forma como o autor pratica sua conduta, sendo que são questões absolutamente independentes.
Porém, o julgador, não se limitou a essa questão, pois também fundamentou a não aplicação do princípio da insignificância sustentando que o valor subtraído não era insignificante, mas essa discussão fica para outro momento.

Fonte:Humberto B

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