As escutas telefônicos produzidas na Operação Monte Carlo foram a base para a criação da CPI do Cachoeira. Contudo por pouco elas não foram declaradas ilegais. Isso porque o desembargador Tourinho Neto, do TRF-1 (Tribunal Regional da 1ª Região) as considerou ilegais já que elas foram motivas por uma denúncia anônima. Porém, os outros dois desembargadores do mesmo Tribunal tiveram um entendimento diferente e determinaram que as escutas e a toda a operação eram válidas.
Você sabe em quais condições são permitidas as escutas telefônicas? Como elas devem ser requeridas? Quem pode ser alvo de gravações? Especialista em Direito Penal, o professor Rodrigo Bello, responde essas perguntas e apresenta uma importante análise sobre as gravações telefônicas, contextualizado o termo juridicamente e questionando a forma como elas são abordadas pelos veículos de notícia.
Por Rodrigo Bello*
Um dos atores principais na busca pelo ibope na mídia são os vulgarmente e erroneamente denominados “grampos”, também chamados de “escutas”, “interceptações” e “gravações”. O povo fica confuso. É tudo a mesma coisa? Veremos que não.
Certa vez me deparei com a seguinte notícia: “Suspeito é grampeado e polícia deve prender em breve”. Confesso que me senti num filme norte-americano tamanha a utilização de termos cinematográficos. Não sou daqueles que buscam a pureza, a essência cristalina, o formalismo exagerado, mas limites todos nós temos.
Em primeiro lugar, vale delimitarmos os conceitos envolvidos sobre as escutas telefônicas. Comecemos.
Grampo é um termo estranho à ciência jurídica. A mídia a utiliza, como também utiliza “arapongagem” em homenagem ao detetive global.
Suspeito idem, pois tecnicamente falando, ideal seria chamarmos de indiciado aquele que é submetido a uma investigação, seja ela através de um Inquérito Policial, seja ela através de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Já acusado é a melhor terminologia para aquele que está sendo processado através de um processo penal justo e democrático, valendo-se das garantias do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. Antes que alguns possam clamar por “absurdo um criminoso ter direito à isso tudo”, não coloque a culpa no processo penal. Nossa democracia exige respeito a determinadas garantias processuais, fundamentais e individuais. Estas são apenas algumas delas. A crítica é permitida, todavia deve, em nossa opinião, vir acompanhada de soluções. Ser contrário ao Estado Democrático de Direito lhe dá que opção?
Sigilo Telefônico são os dados telefônicos numéricos realizados. Seria a conta de telefone que recebemos no final do mês. Com essas informações os investigadores e promotores de justiça terão subsídios para analisar a quantidade de ligações realizadas para um determinado número. Esta colheita de informações é permitida pela CPI.
Avançando nos conceitos, escuta telefônica seria quando um dos interlocutores sabe da gravação. A análise sobre a legalidade desta gravação deve ser minuciosa, caso a caso, sendo lícita em casos onde não há, claramente, um incentivo por parte do interlocutor em informações que possam incriminar o outro interlocutor que não sabe da gravação.
Concluindo, interceptações telefônicas seriam as gravações realizadas por um terceiro de outros dois que não sabem que estão sendo gravados. Esta forma de colheita de informações merece um estudo pormenorizado, pois a Constituição Federal, no art. 5º XII, protege a intimidade e a privacidade e além disso o legislador infraconstitucional se preocupou em 1996 com tal tema editando a lei 9.296.
Quando pode esta interceptação?
Qual o prazo?
Quem pode interceptar?
Em qualquer crime pode ter a interceptação?
Estaríamos, em 2012, respeitando as garantias individuais estabelecidas na Carta Magna?
Poderíamos exigi-la dos sedentos por informações? Dos adeptos da política criminal de tolerância zero?
Razoabilidade. Precisamos aprender a usá-la. Antes que venham as críticas ao discurso, um adendo. Não lutamos por impunidade. Lutamos por um processo penal justo. Somos “filhos” da Constituição de 1988?
Razoabilidade. Precisamos aprender a usá-la. Antes que venham as críticas ao discurso, um adendo. Não lutamos por impunidade. Lutamos por um processo penal justo. Somos “filhos” da Constituição de 1988?
Retroceder ou avançar? Não nos parece interessante voltarmos à épocas ditatoriais onde os direitos individuais eram facilmente desrespeitados. Somos maduros o suficiente para encararmos os mandamentos constitucionais ou é mais fácil discursar ferozmente por penas mais rigorosas e persecuções desenfreadas?
A lei 9.296/96 precisa ser respeitada, por mais críticas que ela possa ter. Pergunto-lhes. Você conhece alguma lei que gerou uma satisfação geral?
Em tom de clamar por conscientização, apresento-lhes os requisitos legais para a interceptação telefônica segundo a lei 9.296/96:
a) somente para fins criminais (art. 1º)
b) autorização judicial (art. 1º)
c) somente para crimes apenados com reclusão (art.2 III – interpretação contrario sensu)
d) para fatos certos e determinados (art. 2º §único)
e) em último caso (art. 2º II – interpretação contrario sensu)
Em recente julgado, o STJ declarou a nulidade de uma interceptação telefônica que seria a primeira
medida da correspondente investigação. Um absurdo. Uma “preguiça” investigatória que não pode ser utilizada. Veio bem a decisão.
medida da correspondente investigação. Um absurdo. Uma “preguiça” investigatória que não pode ser utilizada. Veio bem a decisão.
Hoje a interceptação telefônica é uma realidade. Sem dúvidas. Todavia, porque não a interpretarmos constitucionalmente e legalmente? Porque deixar na mão do operador do direito de forma leviana esta forma de colheita de informação que gera o desrespeito a um dos bens jurídicos individuais mais importantes, a intimidade?
Enfim, que caminhemos no sentido de um avanço em todas as formas de investigação, perícias, inquirições, exames. Que não tenhamos tão somente essa ferramenta da interceptação telefônica, como nos parece que está acontecendo.
Fonte:Última Instância
Nenhum comentário:
Postar um comentário