quarta-feira, 24 de outubro de 2012

O aborto que se avizinha

Por Eudes Quintino de Oliveira Júnior,
promotor de justiça aposentado, advogado e reitor da Unorp.
 

O tema aborto vem frequentando as discussões e a conclusão é que sempre carrega muita polêmica, por ser incandescente e envolver posições inquebrantáveis.  Aparentemente é repetitivo, porém, na realidade, a reiteração é justamente para buscar o amadurecimento a respeito de sua conveniência ou rejeição definitiva. 

O ambiente, quando propício e de alta fermentação coletiva, colabora para a busca  de uma decisão que seja satisfatória à população. Não é um assunto voltado para uma área específica e sim intermultidisciplinar, onde várias vozes da saúde, psicologia, sociologia, religião, direito, ética e outras tantas falam ao mesmo tempo trazendo suas colaborações.

O abortamento é permitido pela lei brasileira em duas situações: gravidez decorrente de estupro ou quando não há outro meio de salvar a vida da gestante. Em ambos os casos, não há necessidade de obtenção de autorização judicial, como é comentado amiúde. E, nesse sentido, entendendo que o problema seja relacionado diretamente com a saúde, o Ministério da Saúde, em caso de gravidez com violência sexual, normatizou o procedimento.

 O STF julgou recentemente a Arguição de Descumprimento a Preceito Fundamental nº 54 e decidiu por oito votos contra dois pela legalidade do aborto de feto anencéfalo. Resta, agora, a feitura da lei específica.

O 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, criado pelo Decreto Presidencial nº 7.037/2009, fala da autonomia da mulher com relação ao próprio corpo e recomenda que o Congresso Nacional altere o Código Penal para que seja descriminalizado o aborto, em qualquer hipótese. Apesar de ser um indicativo da vontade política do governo, o Decreto nº 7.177/2010, alterou o anterior e em seu artigo 1º, letra “g”, estabeleceu: “Considerar o aborto como tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços de saúde”.

A comissão encarregada da elaboração do anteprojeto de Código Penal, além de preservar os casos legais e o de feto anencéfalo, acrescentou outras hipóteses de liberação do aborto: 

a) se a gravidez resulta de violação da dignidade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida; 

b) quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extrauterina, devidamente atestado por dois médicos; 

c) por vontade da gestante até a 12ª semana da gestação, quando o médico ou psicólogo constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas de arcar com a maternidade, como, por exemplo, o uso de entorpecentes.

Na América Latina, o Senado do Uruguai, também em data recente, assim como Cuba e Porto Rico, aprovou lei que autoriza a interrupção da gravidez, em qualquer situação, desde que seja realizada até a 12ª semana de gestação.

A evolução dos costumes traz consigo novas realidades que muitas vezes desmontam a estrutura de valores até então solidamente fincados no universo social e determina uma profunda mudança comportamental. Virar as costas e seguir adiante de nada adiantará porque o novo embrião, que se encontra em gestação, vem ganhando corpo e, ao que tudo indica, após o parto, será coberto pelo manto da legalidade.

Um comentário:

  1. É um bom tema para se discutir em uma aula sobre Direito Humanos

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