A presunção de violência no crime de estupro tem caráter relativo e pode ser afastada diante da realidade concreta; o posicionamento é da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
A Min. Maria Thereza, que relatou os autos (cujo número não pode ser divulgado), explicitou que não se pode considerar crime o ato que não viola o bem jurídico tutelado e, no caso, as menores que, hipoteticamente foram vítimas de abuso sexual, prostituíam-se há tempo.
De acordo com a lei, antes da reforma de 2009, presumia-se a violência se a vítima não fosse maior de catorze anos. O acusado respondia ação penal porque teria estuprado três meninas de 12 anos.
De acordo com a lei, antes da reforma de 2009, presumia-se a violência se a vítima não fosse maior de catorze anos. O acusado respondia ação penal porque teria estuprado três meninas de 12 anos.
O réu foi inocentado em primeira e segunda instâncias exatamente sob o mesmo fundamento: as garotas já se dedicavam à prática de atividades sexuais desde longa data.
A Quinta Turma do STJ, no entanto, entende pelo caráter absoluto da presunção de violência no estupro praticado contra menor de 14 anos. Daí os embargos de divergência levados a julgamento perante a Terceira Seção, pois a Quinta Turma entendia que a presunção era absoluta e a Sexta considerava ser relativa.
O julgamento da Terceira Seção não foi unânime, foram vencidos os ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior.
Para a relatora: “não me parece juridicamente defensável continuar preconizando a ideia da presunção absoluta em fatos como os tais se a própria natureza das coisas afasta o injusto da conduta do acusado (…) o direito não é estático, devendo, portanto, se amoldar às mudanças sociais, ponderando-as, inclusive e principalmente, no caso em debate, pois a educação sexual dos jovens certamente não é igual, haja vista as diferenças sociais e culturais encontradas em um país de dimensões continentais” (STJ).
A mídia populista, assim como os agentes públicos da mesma ideologia, saíram atacando ferozmente a Ministra Maria Thereza (relatora do caso).
Os populistas hiperpunitivistas esquecem do Estado de Direito vigente. De acordo com o ECA, são crianças as pessoas com menos de 12 anos. A partir dessa idade são adolescentes. Dos 12 aos 14 anos é claro que a presunção de violência da lei tem que ser relativa (cada caso é um caso). Por que? Porque, pelo ECA, o adolescente tem relativa capacidade de entender e de querer (tanto que está sujeito a várias sanções reeducativas). Se está sujeito a sanções, é porque já sabe (relativamente) o que faz. Se a adolescente de 12 anos já é uma prostituta pública, claro que nenhuma ofensa ao bem jurídico dignidade sexual existe. Sem ofensa ao bem jurídico protegido pela lei não existe crime.
Não há dúvida que nosso discurso civilizatório vai no sentido de que é um absurdo manter relações sexuais com adolescentes de 12 anos. O turismo sexual é abominável. Temos que proteger eficazmente as crianças e os adolescentes. Mas entre um ato imoral e um crime há uma distância muito grande. Condenar quem faz isso do ponto de vista moral nos parece correto. Imaginar ou pressionar os juízes para que condenem todo mundo, inclusive quando não há crime nenhum, é um exagero. E é de exagero vingativo que vive o populismo penal, seja midiático, seja político, seja judicial ou penitenciário.
Que fique registrado aqui nosso apoio à decisão da Ministra Maria Thereza (aliás, também à maioria que a acompanhou). Ainda há juízes neste país que em alguns momentos não se veem contaminados pelo avassalador populismo punitivo. Do absurdo maior a mídia praticamente nada fala: como é que um país, sexta economia do mundo, deixa seus jovens chegar ao extremo da prostituição pública que, seguramente, não foi fruto de uma opção livre? É disso que temos que cuidar. Prevenir o desvio aberrante dos jovens é mais barato que ficar martelando no vingativo e emotivo populismo punitivista.
Fonte: LFG
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