Criado há 12 anos, o Instituto Pro Bono pleiteia o direito de representar gratuitamente quem não pode bancar um advogado
Foi por causa de R$ 1 que a maior dor de cabeça de Eliana começou. Funcionária da rede pública de ensino (seu sobrenome foi omitido a pedido de seus advogados), ela firmou uma sociedade com a irmã 18 anos atrás. A quantia irrisória foi tudo que investiu na parceria, desfeita um ano depois, com a falência do negócio. Quatro processos trabalhistas relacionados à empresa, no entanto, a assombram até hoje – com a morte da irmã, tempos depois, Eliana virou a única ré. A Justiça decretou o leilão de sua casa, já executado, e o bloqueio de um empréstimo feito para custear um tratamento de saúde. Mas a pendenga jurídica não chegou ao fim. Os honorários cobrados por um advogado especializado em casos assim são, em média, de R$ 15 mil, uma fortuna para quem ganha menos de R$ 2 mil por mês. Eliana só voltou a dormir mais aliviada em agosto, quando encontrou alguém para defendê-la de graça, o Instituto Pro Bono.
A gratuidade não é uma regalia à Eliana. Criado em 2001, com sede na Avenida Paulista, o instituto tem como objetivo disponibilizar, na faixa, apoio jurídico a quem não pode pagar. Resumo de pro bono publico, do latim, pro bono quer dizer “para o bem da população”. Fazem parte da entidade 600 advogados, quase o mesmo número de processos analisados, envolvendo desde a regularização de terras quilombolas até um pedido de indenização por erro médico. Até junho passado, porém, somente defesas de organizações não governamentais (ONGs) podiam ser aceitas. Isso porque a representação gratuita de pessoas físicas por parte de profissionais independentes não era permitida pela seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). No entender da entidade, a atuação voluntária favorece a concorrência desleal. Pressionada a mudar de posição, ela transferiu a polêmica a seu conselho federal, que deverá se manifestar em breve. Enquanto isso não ocorre, o Instituto Pro Bono pode trabalhar sem amarras.
Sua atuação poderá aliviar a vida da Defensoria Pública de São Paulo, destinada só a famílias que ganham até três salários mínimos ou tenham acumulado no máximo R$ 95 mil de patrimônio, entre outros pré-requisitos. “O órgão não dá conta da demanda”, afirma o diretor do Instituto Pro Bono, o advogado Marcos Fuchs. O problema se agrava quando o foco é ampliado. Segundo um levantamento da Associação Nacional dos Defensores Públicos divulgado em março, 72% das comarcas brasileiras não dispõem de um único defensor. Para garantir o atendimento jurídico aos mais necessitados, o governo estadual firmou um convênio com a OAB paulista em 1986. Por meio dele, 48 mil advogados podem prestar assessoria jurídica à população de baixa renda nas vezes em que a Defensoria Pública não dá conta do recado. Nesse caso, os honorários são pagos pelo Estado.
“Em nenhuma outra profissão o trabalho voluntário é proibido”, diz Fuchs. “Esperamos uma decisão que acabe com qualquer limitação.” Nos Estados Unidos, para efeito de comparação, a advocacia pro bono é tida em alta conta. Como os defensores públicos de lá só têm permissão para atuar na esfera criminal, estima-se que a soma das horas de trabalho voluntário de escritórios particulares gire em torno de 5 milhões por ano. Um modelo para qual a Justiça brasileira fecha os olhos.
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