Apresentação: Coluna escrita com base em Monografia[1]
apresentada à Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, em parceria com a Escola
Superior de Magistratura da Paraíba – ESMA-PB, como parte dos requisitos para a
obtenção do título de Especialista em Prática Judicante, cujo orientador foi Dr.
Bruno César Azevedo Isidro, ao qual devoto singular
admiração pelo Exímio Juiz do Tribunal de Justiça da Paraíba e sua qualificação
como Doutor pela Universidade do Estado do Rio
de Janeiro – UERJ.
A discussão a ser realizada propõe-se a analisar um assunto
que está em evidência no contexto atual, uma nova visão da justiça
contemporânea, o emprego da sua forma restaurativa. Esta é visualizada como um
instrumento da criminologia que busca a inovação da intervenção penal, exibindo
outro olhar e forma de interferência sobre o crime.
Para compreendê-la é preciso usar outras lentes. Aliás,
denomina-se Changing Lenses: A New Focus for Crime and Justice[1]
a obra de Howard Zehr (1990), uma das mais consagradas referências
bibliográficas sobre a Justiça Restaurativa.
Pode-se
dizer que, apesar de ser um paradigma novo, já existe um crescente consenso
internacional a respeito de seus princípios, inclusive oficial, em documentos
da ONU e da União Européia, validando e recomendando a Justiça Restaurativa para todos os países.
A partir destes formulou-se
a seguinte conceituação: Justiça
Restaurativa é um processo através
do qual todas as partes envolvidas em um ato que causou ofensa reúnem-se para decidir coletivamente
como lidar com as circunstâncias
decorrentes desse ato e suas implicações para o futuro. Assim, o processo restaurativo engloba o próprio
conceito do que é justiça restaurativa, no qual as partes atuam de maneira
coletiva na restauração do dano causado, com a intervenção de um facilitador.
No Brasil, em
consonância com as lições de Damásio, as iniciativas são promovidas por juristas[1].
Nesse prisma, conforme dados do Conselho Nacional de
Justiça, esta prática encontra-se em funcionamento há mais de 10 anos no país. É
conhecida como uma técnica para solução de conflitos que prima pela criatividade e sensibilidade na
escuta das vítimas e dos ofensores. Saliente-se
ser incentivada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Protocolo de Cooperação para a difusão da Justiça Restaurativa, firmado com a Associação dos Magistrados Brasileiros
(AMB)[2].
Acerca do seu
tratamento na legislação, com as inovações da Constituição de 1988 e o advento da
Lei dos Juizados Especiais abre-se uma pequena janela ao princípio da
oportunidade, permitindo certa acomodação sistêmica do modelo restaurativo,
mesmo sem mudança legislativa.
A Constituição prevê, no art. 98, I, a possibilidade de
conciliação em procedimento oral e sumaríssimo, de infrações penais de menor
potencial ofensivo. Por seu turno, a fase preliminar
prevista nos arts. 70 e 72 a 74, da Lei 9.099/95, pode ter a forma
restaurativa.
Tais
dispositivos, interpretados extensivamente e com base na diretriz hermenêutica
do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, são normas permissivas e que
legitimam a ilação de que esse procedimento pode ser encaminhado a um Núcleo de
Justiça Restaurativa.
Outra janela
para a alternativa restaurativa é o instituto da suspensão condicional do
processo para crimes em que a pena cominada seja igual ou inferior a um ano,
para qualquer tipo de crime e não apenas aos crimes cuja pena máxima seja de 2
(dois) anos.
De igual
modo, nos crimes contra idosos, o processo restaurativo é possível, por força
do art. 94, da Lei n. 10.741/03 – o Estatuto do Idoso – que prevê o
procedimento da Lei 9.099/95 para crimes contra idosos cuja pena privativa de
liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos.
Além dessa,
o Estatuto da Criança e do Adolescente enseja e recomenda implicitamente o uso
do modelo restaurativo, em vários dispositivos, particularmente quando dispõe
sobre a remissão (art. 126) e diante do amplo elastério das medidas
sócio-educativas previstas no art. 112 e seguintes do diploma legal.
Porém é
preciso ter sempre presente que o procedimento restaurativo não é, pelo menos
por enquanto, expressamente previsto na lei como um devido processo legal no
sentido formal. A aceitação, pelas partes, da alternativa restaurativa, por essa
razão, não pode ser imposta.
Por fim, convém ser citado um exemplo que pode ser
considerado sobre todos quando depois de 27 anos Nelson Mandela sai da prisão,
a sua primeira mensagem ao país foi “reconciliação e unidade”. Para reparar o
mal nomeou, em 1996, a Comissão pela Verdade e a Reconciliação, uma forma criativa de mostrar a repulsiva
verdade da opressão sem exigir vingança. na qual se um opressor enfrentasse seus acusadores
e confessasse plenamente seu crime, ele não poderia ser processado por esse
crime.
[1] Trocando as lentes: um novo foco sobre crime e justiça, tradução nossa.
[2] CANANÉA, Helena Virgínia Roque. A problemática de instauração da Justiça Restaurativa no Brasil e o papel do magistrado na sua aplicação. João Pessoa, 2015
[4] Justiça Restaurativa: o que é e como funciona. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/62272-justica-restaurativa-o-que-e-e-como-funciona. Acesso em: 22 jun. 2016.
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